terça-feira, 7 de julho de 2009

Verde

Um cortejo de nuvens ruma ao sul
Fragmentos de silêncio
Unificam-se ao longe
Devolvendo-nos a paz por momentos
Pensamentos contraditórios
Compartilham o mesmo espaço
Onde as arvores fazem vénia ao vento
Vento que leva
Barcos a vela, papagaios e pensamentos de meninos descalços
Enquanto as carícias incessantes das ondas
Tentam passar despercebidas
Familiarizando-se
O mar no banco dos réus
O traje negro e os orfãos
O dia de matar as saudades
Até as pedras das calçadas
Sabem do dia a dia das gentes das ilhas
Que das cores só o verde lhes foi dado
Mas em letras.


Doca

Uma nuvem de fumo

Uma nuvem de fumo
A espera que o tempo a desfaça
Fazendo piruetas
Criando imagens
Exibindo a sua indefinição
Lutando contra cada segmento do tempo
Para imortalizar a sua presença

Moldando-se ao sabor de cada brisa
O fumo de um cigarro aceso
Que já foi fogo
Que desfez tudo o que a ele se afeiçoou
Num epitáfio em cima de um túmulo
A memória que restava de um guerreiro
Desfez-se com o tempo

Doca

Um simples olhar no escuro

Um simples olhar no escuro
Num brusco movimento de olhos
Um momento de espera
Algo que não acontece
Três segundos de morte
Um século de reflexão
Um bailarino sem rosto
Na dança obrigatória
Ao som da música que não se ouve
Gargalhadas de loucura
No espaço entre o eu e o tu
Tudo encontrado no antes de cada pensamento

Doca

Sombras

Um jardim secreto
um deserto
Uma chuva de areia

Uma abelha feliz
Uma flor sem néctar
Um mocho em voo
Em pleno dia de sol
O amor vindo dum lado só

Dos desgostos fazer versos
Dos gostos o inverso
Da nossa felicidade
As desgraças
Uma arvore,
A seca
Um caixão
E sete palmos e terra.


Doca

Sombras

E as sombras deixaram de existir
Pois em cada sombra de homem
Os próprias homens existem
E os homens,
Objectos das sombras
Caminham sem sombra de dúvida
A procura de quem são eles sombras

Nesse palco de sombras chinesas
As próprias sombras são quem assistem
As peças representadas por homens sem sombras
Que no fim de cada acto
Não chegam nem perto das sombras
De o que deviam ser
As suas próprias sombras


Doca

Se eu me perder

Se eu me perder
Em lugar nenhum
E tu me achares em tudo
Mesmo onde eu nunca estive
Onde eu sempre estou
Não me puderes distinguir
Do próprio lugar onde estas
Ai sim, estarei vivendo
Não a vida que tenho
Mas, a que tento viver
Quando eu não te puder prender
Nem sentir a tua ausência
Ai sim
Ter-me-ás para sempre




Sim, um sonho
E é tudo


Doca

redondo

Redondos sentimentos
Sem fim cada momento
E no fim, por onde começar
A preto e branco
Um puro sorriso
Numa face triste
Acarinhada pelo cansaço
Do fechar de cada circulo
Horizontes verticais
Caminho percorrido
Por todos os amores
Círculos fechados
Verdades reveladas
Início das dores
Percorrer-te com olhos errantes
Renovar sentimentos redondos
Ficar suspenso
Sem saber por onde terminar...

Doca

Pintar

Se algum dia
Pudesse pintar a vida
Com os sons do mundo
Pintava-lhe com os sons da morte
E se na vida
Tivesse de pintar a morte
Pintava-lhe com a cor da vida
Mas, se por isso
Viesse a ser condenado
E fosse eu, o meu próprio juiz
A pena aplicada seria
Nunca conhecer a morte
E com isso, viver para sempre



Doca

Palavras

Se as palavras não forem só palavras
E se elas forem
Um tipo de ponte
Passaporte
Chave da porta
Ou mesmo corda bamba
Que da acesso
A alma do mundo?
Se assim for
Quero ser poeta
Se em cada sílaba
Fluísse uma energia
Capaz de influenciar nossas vidas
Se essas mesmas palavras
Forem só parte de nós
E nós energia fluida
Da alma do mundo
Então, quero mesmo me conhecer

Doca

Paixao

É desconcertante
As formas que o teu corpo descreve
A subtileza com que escorregas
O teu cheiro que me faz agua na boca,
E quando me tocas nos lábios
Descargas de satisfação percorrem meu corpo
Numa mistura de saudade, satisfação
E numa ansiedade crescente
A cada segundo ao teu lado
Minha temperatura sobe
Minhas ideias baralham-se
As palavras voam rumo a liberdade
Muitas vezes sem sentido algum,
Outras, com um grande sentido poético e de sabedoria,
Mas após horas dessa fusão de seres
Na maior parte das vezes
Já com as pernas bambas
Sem equilíbrio nem compostura
Levanto cambaleando-me
E… declamo-te alguns versos
Encima duma mesa, cadeira, ou mesmo do chão
Com a língua já pesando o dobro do peso
… Se eu não te amasse… tanto
Se também não te bebesse brando
E quando te vejo
Nu, nos copos
Sou logo enfeitiçado
Pelo teu sabor
E deixo-me embriagar pelo teu ser
E luto para que este teu corpo e cheiro sejam só meus
E que mais ninguém os sinta
E apesar dessa dança de imagens a minha frente
Ainda estou morto de sede pelo meu puro vinho



Doca

Eu

Incrivelmente a individualidade realça
O doce veneno fortificante
Na alma de cada um de nós
Moldada e moldando-nos a vida
Presa na louca colectividade
Caminhando desorientada
Sem expressão nos rostos
Homens fingem misturarem-se
Na mesma caminhada inconsciente
Ignorando faróis, sinais na estrada
E a sua própria vontade
Homens caminham
Camuflando sentimentos
Tentando fazer as formas
Valerem por essência
Homens caminham
Sublinhando seus nomes

Doca

Dansa de Munde

DANÇA DE MUNDE


E se nô pudesse decifrá
O que sempre confundí nôs
Pegá na lianas
E travessá és rio
Fazé piruetas sob perseguição
Alcansá topo dés montanha
Sem preocupá que vertigem,
Anulá esse espaço entre
Mi ma bô, e permanécé
Onde ceu e terra incontrá
atravessá és porta ainda por abrí
Tchá esse dança de munde prolongá
E sô observá nôs pê dançá
Sem preocupá que qual musica que tá bem depôs
E se cada um conseguí incontrá
Mais um na ele
Má sem esse soma atingi plural,
E resultode permitime oiá mi na bô
Ou isdá Éva mas um vez
A cmé maçã c`Adão
E na fim consegui
Robá foça desse horizonte vertical
E nunca sinti mede
De ca fazé esse percurso outra vez
Talvez, seria esse etapa de mas um vida


Doca